Entreato: Em seu novo EP, Ruadois acelera com peso, propósito e identidade
- Revista Curió
- 2 de jul.
- 4 min de leitura
Por: Ana Carolina Costa e Erick Martins
Última Atualização: 02/07/2025

Ruadois, segundo a sua mini-biografia do Spotify, é “um encontro de mentes criativas, inquietas e sedentas por romper as barreiras musicais contemporâneas”. Para Mirral ONE, um dos integrantes, “Ruadois é Ruadois. Não dá para rotular o Ruadois hoje em dia como uma coisa só, né? Ruadois é rap com música eletrônica e até para além disso”.
O coletivo, ainda que com várias descrições, nasceu no período pandêmico e veio mesmo dessa inquietação de mentes criativas. Mirral ONE, Well e DJ Akila já se conheciam há um tempo antes de decidirem virar grupo, ideia que surgiu por causa do apreço pelo UK Garage (UKG) — gênero pouco explorado na cena belorizontina em 2021 — compartilhado por eles. Assim, a partir dessa vontade de experimentar com a música eletrônica e abrir o caminho para diferentes sons, os artistas vêm caminhando juntos até hoje, somando três EPs, um álbum e diversos singles lançados.
O último release, Entreato, foi lançado no dia 16 de junho e conta com quatro faixas mais voltadas para o rap — som que eles já exploravam individualmente, antes de serem Ruadois. Em entrevista para a Curió, Well disse que a mudança no som aconteceu como algo planejado. “Foi pensando de forma até mesmo estratégica, porque não ia ser legal a gente apresentar só um ritmo, só uma versão da gente. Temos que variar para poder gerar nuance, sentimento... E esse EP serve como essa preparação para o público”, contou. O projeto seria, então, como um meio termo entre lançamentos, e daí que vem o nome.

Confortável sem deixar de subir o level, como rima Mirral ONE em Og.
Apesar de marcar um retorno às origens do grupo, maturidade é o que destaca o EP Entreato. Em aspectos de produção e temática, o projeto volta às estradas familiares do início da carreira do coletivo, mas, dessa vez, com mais peso, forma e direção. Punchlines marcantes e beats sombrios refletem vivência e mergulham em uma estética do hip hop mais duro que remete à projetos como Fml (2021) e Proibido Estacionar - Vol. 1 (2021), que marcaram o começo da trajetória dos artistas como Ruadois.
WELL: "Entreato’ vem mais como um resgate até nostálgico, pelo menos para mim, do som que eu fazia quando comecei. É um som que eu sempre quis fazer, e às vezes não tinha oportunidade de colocar para fora. Por exemplo, a letra de ‘Pesos’ eu escrevi há dois, três anos... Então, é uma parada que eu já queria apresentar há muito tempo."
Entreato é consciente do que quer dizer e de como quer ressoar
Em Entreato, Ruadois consolida uma entrega mais sólida e isso se revela na forma como o EP se organiza. Na formatação do projeto, “Og” e “Pesos” trazem afirmações diretas de identidade, posicionando o grupo como original gangstas. Na sequência, eles reforçam o valor de se lembrar de onde vieram através da lírica, com intenção e propósito. Ao longo do EP, a sensação que fica é que aceleramos junto ao grupo em direção ao futuro, reconhecendo e reafirmando o patamar alcançado, mas sem deixar de olhar no retrovisor e refletir sobre o caminho percorrido.
Mirral ONE: "A gente até brincou uma vez... Perguntaram 'Ah, mano, o que é isso aí que vocês estão fazendo?' Mano, isso é Ruadois. Nós estamos aí para experimentar, juntando e criando coisas."
Em linhas ácidas, Ruadois constrói um som ousado e original. As combinações de diferentes elementos da música eletrônica, como o UKG e o drill encontram-se com as marcas estilísticas mineiras em gírias e referências, características centrais do trabalho do coletivo. Os ritmos servem como plano de fundo para uma perspectiva centrada na realidade da vivência negra e periférica de Belo Horizonte, veículos que criam uma atmosfera cinemática e discutem os desafios da vivência urbana a partir do ponto de vista mineiro. Segundo Mirral, eles pensam muito em representar BH e Minas Gerais. “Ter essa essa marcação de presença (através das marcas estilísticas e de fala) é muito importante para as pessoas saberem da onde a gente é”, disse.

A rua é palco para a originalidade e qualidade visual do projeto.
A estética visual de Entreato recorre à atmosfera gangsta clássica do cinema e dos videoclipes dos anos 90, fazendo referência a vida noturna das capitais, que o trio tenta encapsular. Em um equilíbrio entre sobriedade e casualidade com alfaiataria e streetwear, Ruadois são os donos da cena. Num carro verde abacate, Well, Mirral ONE e Akila percorrem as ruas de BH com atitude. O visual se apoia na estética periférica e dialoga com a cultura do hip hop para dar poder e movimento a um Ruadois que está no volante da própria narrativa.
É Menê, fotógrafo mineiro, que assina a Direção Criativa, Direção de Arte e a Fotografia do projeto, com styling de Kellé e assistência de Gabriel Figueredo, artistas que também tiveram muito destaque dentro do processo criativo do lançamento.
Sob management, produção executiva e audiovisual de Gabriela Gomes e produção musical de Arthur PS, o EP Entreato marca um respiro entre cenas.
O projeto antecede o próximo lançamento do grupo, intitulado Sinfonia Marginal, previsto para ser lançado ainda em 2025.
WELL: "Foi uma conversa que eu e Mirral tivemos. O EP veio meio que como uma válvula de escape mesmo, para testar possibilidades, mas também resgatar essa nossa essência, né? Nos aproximar do que trouxe a gente até aqui."
As diferentes abordagens sonoras e visuais do Ruadois, principalmente em seus últimos dois projetos, mostram que o grupo é capaz de explorar diferentes perspectivas artísticas sem abrir mão de sua identidade, transitando entre sons sem perder a essência. Entreato é mais um projeto rico e potente do grupo que, mesmo inédito, já é referência. Como eles mesmos disseram em Rua, lá em 2022:
Ser real é estar no front
Vida longa aos meus OGs
Tá no jogo não é de hoje
Ref pega lá na fonte
Ruas de Belo Horizonte



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