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Com Tocaia, Davi Fonseca aposta em intercâmbio musical e conexão com o público

  • Foto do escritor: Revista Curió
    Revista Curió
  • 22 de out.
  • 3 min de leitura

Por: Gabriel Vergueiro

Última Atualização: 22/10/2025


 Foto por Ciro Thielmann
 Foto por Ciro Thielmann


A palavra “tocaia” vem do tupi-guarani e, por definição, é uma emboscada, um esconderijo em que se oculta o caçador para espreitar a caça, local de captura. Mais ou menos nessa toada, o cantor, compositor e instrumentista, Davi Fonseca, deu vida recentemente ao projeto Tocaia, em que realiza um intercâmbio com seus pares musicais com shows em São Paulo e Belo Horizonte. A cada edição, Davi convida um artista dessas cenas para duas apresentações em conjunto, uma em cada cidade, ora como visitante, ora como anfitrião. Dentro desse deslocamento, o artista estabeleceu para seu trabalho um público e uma lógica alternativos ao mercado.


O projeto nasceu faz alguns anos, a partir das idas e vindas do artista para São Paulo — onde hoje mora — e o cenário artístico com o qual se deparou. Davi, nas trocas com outros músicos, enxergava uma cena muito diversa e com potencial de expansão, o que o motivou a querer acelerar seu processo de inserção nesse espaço. Para isso, em vez de esperar o convite de terceiros, decidiu tomar a dianteira e fazer ele mesmo a vez de anfitrião.


A iniciativa, hoje realizada com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte e patrocínio da UniBH, começou pequena, como Fonseca conta: “Eu fiz na sala da casa de uma tia minha, que mora em São Paulo. Depois eu fiz na sala da Luiza Brina. Sempre existia esse desejo de não só fazer o show aqui [em São Paulo] e, de certa forma, ser apresentado ao público da pessoa, como também levar a pessoa para Belo Horizonte e retribuir a gentileza. É um projeto que tem muito a ver com encontros verdadeiros”.


Entre os artistas selecionados por uma equipe de curadoria, passaram nomes como o mineiro Rafael Martini, a holandesa-mineira Jasmin Godoy, a pernambucana Alessandra Leão, a baiana Lívia Mattos, a paulistana Loreta Colucci e as mineiras Juliana Perdigão e Josy.Anne. Iara Rennó, cantora e compositora paulistana, fará o encerramento da temporada 2025 do Tocaia; amanhã, 23, em São Paulo e sábado, 25, em Belo Horizonte. O que, inicialmente, no papel, seria uma pequena participação, se tornou dueto completo. Os shows acabaram ganhando outros tons, agora de parceria. 


“É um desafio enorme montar shows inéditos com pessoas. Das oito, eu só tinha tocado mesmo, feito um show, com uma delas [Rafael Martini]; o resto foram todos encontros inéditos. Não há muito onde se esconder. Você está exposto, a intimidade exposta e a musicalidade de cada um muito evidente. E onde as musicalidades se encontram — e onde não se encontram também — que é maravilhoso”, diz o músico.


 Foto por Ciro Thielmann
 Foto por Ciro Thielmann

O nome do projeto parte justamente dessa exposição. É como uma arapuca, mas, aqui, é Davi que está — e ele mesmo se coloca — na mira, à disposição e à vista de todos. Existe uma vulnerabilidade muito importante no artista receber um convidado e estar disponível para o maior número de trocas possíveis nesse espaço, sobretudo em um mercado tão instantâneo e pouco flexível como o que está hoje estabelecido. É se arriscar, dar valor à troca, ao desafio, ao exercício raro da escuta.


E isso vai ao encontro de uma deficiência que o artista encontrou nas casas de show da cena. Davi foi percebendo que, em Belo Horizonte — mas acredito que essa seja uma questão nacional, quem sabe até mundial —, os locais para tocar estavam cada vez menos interessantes para os músicos. Conversas paralelas e excesso de barulho são problemas frequentes em shows, principalmente no cenário pós-pandêmico, em que a platéia parece ter esquecido como costumava assistir e consumir um espetáculo. 


“Eu sinto falta de conversar depois do show com as pessoas. ‘O que foi legal? O que não foi? O que pode ser melhor?’. Eu acho que, indiretamente, o Tocaia surge disso também, de um desejo de fazer um circuito alternativo aos espaços de escuta cada vez menores”, comenta.


É nesse sentido que Davi Fonseca — novamente tomando a dianteira — elabora com Tocaia a criação não só desse espaço próprio de escuta, como também do público que o acompanha. Para ele, além da relação com o artista convidado, muito o interessa como projeto a troca com as pessoas presentes. Esse lugar de vulnerabilidade da tocaia em que ele se coloca é um atrativo para os músicos com os quais ele dialoga no palco e também para quem o assiste da platéia. Entre a eterna novidade de São Paulo e o acolhimento de Belo Horizonte, entre a aventura e o aconchego, Davi Fonseca inverte a arapuca e se torna o indivíduo exposto que arma contra o que está oculto. A falta de escuta, a apatia do público, as carências de uma estrutura artística estabelecida; tudo isso vira presa. Que siga firme essa tocaia!


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