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CRÍTICA: A matemática romântica de Amores Materialistas

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    Revista Curió
  • há 22 horas
  • 4 min de leitura

Em seu segundo filme, a diretora Celine Song propõe um confronto entre o idealismo e o realismo nos relacionamentos amorosos


Por: Ana Clara Moreira e João Pedro Ribeiro

Última atualização: 07/08/2025


Divulgação/Sony Pictures
Divulgação/Sony Pictures

Existe uma receita certeira para o amor? Talvez não, mas existe um cálculo. Pelo menos é assim que a casamenteira Lucy (Dakota Johnson) responderia essa pergunta, que assombra os românticos do mundo todo, no novo longa da diretora canadense Celine Song, Amores Materialistas (2025).


Responsável por acabar com a solidão de qualquer pessoa em Nova York pelo preço certo, Lucy sabe quantificar com precisão o “valor de mercado” que cada um tem a partir de características físicas, temperamento e renda. Em busca de combinações perfeitas – como se fosse a personificação de um aplicativo de relacionamentos –, a protagonista aproveita todas as oportunidades de recrutar candidatos com potencial para os encontros que organiza. 


É em um dos casamentos arranjados pela própria Lucy que ela conhece o empresário romântico e bem-sucedido Harry (Pedro Pascal), quase ao mesmo tempo em que reencontra um ex-namorado aspirante a ator, John (Chris Evans). Diametralmente opostos, os dois suprem as necessidades daquela exigente mulher em diferentes aspectos: enquanto um compreende e acolhe os sentimentos dela de forma muito orgânica, o outro tem todos os recursos para garantir o conforto material que ela almejava.


O arquétipo de um amor seguro e estável versus uma paixão avassaladora dá – ou tenta dar – o tom da narrativa, que se perde um pouco na atuação inexpressiva de Dakota Johnson e na insistência em algumas respostas prontas e previsíveis. De qualquer modo, tanto por meio do arco da protagonista quanto dos coadjuvantes, somos levados a refletir sobre escolhas e concessões, tão importantes em qualquer relacionamento.


Divulgação/Sony Pictures
Divulgação/Sony Pictures

Diferente dos romances ou comédias românticas tradicionais, que, via de regra, nos fazem torcer por casais que provavelmente não existiriam fora da ficção, o filme aborda questões interessantes também sobre o que esperamos ao entrar em uma relação. Assim como em Vidas Passadas (2023), primeiro título dirigido por Song, somos confrontados com dilemas inerentes aos nossos desejos, e, além disso, às possibilidades de equilibrá-los com necessidades básicas de todo ser humano.


O longa transita entre tensionamentos e reflexões discretas acerca da forma como nos relacionamos. O que procuramos uns nos outros? Por que devemos nos casar? Afinal, o que é o casamento? Na cerimônia em que Lucy se encontra com Harry e John, uma dessas perguntas é posta explicitamente pela cliente que, minutos antes do seu “grande dia”, começa a se fazer esses questionamentos. É neste momento que, de coração e lente abertos, Celine Song revela o potencial do seu cinema: um espaço livre de julgamentos.


Combinando debates atemporais com circunstâncias próprias do momento em que vivemos, a diretora trata, com sutileza, de assuntos espinhosos como violência contra a mulher, papéis de gênero e a idealização das pessoas e das relações. Acima de tudo, Amores Materialistas provoca o espectador a refletir sobre o peso das convenções na vida em sociedade – é possível sentir a diretora nos indagando se realmente queremos certas coisas ou se apenas fomos ensinados a buscar por elas.


Existe uma forte tentativa de Celine Song de encontrar o equilíbrio entre o idealismo e o realismo romântico. A diretora canadense busca criar uma trama em que tentar se desgarrar dos convencionalismos que nos aprisionam não signifique, por outro lado, deixar de sonhar. Essa questão é materializada, naturalmente, na busca de Lucy – justamente alguém cuja função na sociedade é trabalhar com as idealizações alheias – por um par ideal. Entre problemas na vida profissional e amorosa (que estão diretamente relacionados), a casamenteira se vê obrigada a buscar respostas para as perguntas acima.


Divulgação/Sony Pictures
Divulgação/Sony Pictures

Sem spoilers, pode-se afirmar que as respostas nunca convencem o suficiente. Talvez seja porque a diretora evita uma suposta resolução absoluta para os problemas amorosos – que, tanto nós quanto ela sabemos, não existe. Ainda assim, as interações e decisões de cada personagem são repletas de uma carência de sentido e, até mesmo, de significado.


Até mesmo o materialismo, que dá nome ao filme, soa como algo que nunca chega a ser efetivamente trabalhado, excluindo breves exceções (como a suposta obsessão de Lucy por achar um parceiro financeiramente abastado). Em certa medida, a obra acaba se tornando vítima da simplicidade e leveza escolhidas para abordar essas questões, postergando continuamente um aprofundamento em alguma questão específica.


Como dito acima, até existe uma recusa à resposta absoluta que é realmente muito louvável. Além disso, o fato de Harry e John não estabelecerem uma “disputa pelo coração da mocinha”, algo típico do gênero, também é uma grata surpresa. Ambos sempre respeitam o espaço e as decisões de Lucy, sem que isso signifique abdicar de seus próprios interesses. Nesse sentido, o real problema aqui é a construção de um “vir a ser” da história que, na verdade, nunca chega.


Divulgação/Sony Pictures
Divulgação/Sony Pictures

Afirmar que “subverte o gênero do romance”, como declarou Pedro Pascal, parece um grande exagero para se referir a Amores Materialistas. Contudo, o filme pode ser uma ótima pedida para aqueles dias em que tudo que você quer é assistir um romancezinho interessante que não apenas repita as fórmulas que já existem por aí. Existem muitas questões interessantes a serem tiradas do longa, mas exigem uma certa boa vontade do espectador para encontrá-las num roteiro que recorre a excessivas repetições para provar seus pontos. Talvez a perspectiva matemática que resta da obra é que, às vezes, menos é mais.


Nota: 3/5


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