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Crítica: Highest 2 Lowest (2025)

  • Foto do escritor: Revista Curió
    Revista Curió
  • 18 de set.
  • 4 min de leitura

O famoso diretor nova-iorquino Spike Lee e o galã Denzel Washington se unem, possivelmente, pela última vez.


Por: Gabriel Monteiro e Pedro Fraga

Última atualização: 15/09

Apple Tv/Divulgação
Apple Tv/Divulgação

A superestrela do cinema Denzel Washington e o tradicional diretor e roteirista Spike Lee ganham mais um longa-metragem para sua lista histórica de parcerias – que conta com clássicos como Malcolm X (1992) –, no que ambos consideram, talvez pela idade, como seu último trabalho juntos. Dessa vez, pulando as telas do cinema e sendo lançado diretamente para o serviço de streaming Apple Tv+, Highest 2 Lowest (2025), traduzido no Brasil como Luta de Classes, segue a mesma lógica de distribuição de seu projeto anterior, o filme Da 5 Bloods (2020), que foi lançado diretamente pela Netflix. Com um cenário e uma temática muito diferentes desse novo lançamento, Da 5 Bloods, apesar de se limitar ao universo do streaming, encontrou um público dedicado que aprovou a qualidade da produção. Mas será que esta nova empreitada de Spike se sustenta da mesma forma?


Highest 2 Lowest acompanha a história de David King, interpretado por Denzel Washington, um produtor musical e dono de uma grande gravadora que, no passado, foi a maior de seu ramo. Conhecido por ter os melhores ouvidos para descobrir novos artistas, King vive uma era em que sua empresa está em baixa, mas, apegado ao que um dia foi, pretende utilizar de todos os seus recursos para voltar ao topo. O conflito do filme surge quando o filho de seu motorista e melhor amigo é sequestrado no lugar de seu próprio filho. Nesse momento, King se vê diante do dilema de abrir mão do dinheiro que pode recuperar sua carreira de sucesso ou arriscar tudo para salvar a vida do jovem.


A ideia de retratar um empresário em um dilema moral é herdada do filme que inspira esta adaptação: High and Low (1963), do diretor Akira Kurosawa. A questão é que, se neste longa a ambientação é a década de 1960 em um Japão afundado em desigualdades sociais no período pós-Segunda Guerra Mundial, em Highest 2 Lowest Spike Lee até tenta transportar tais temáticas para uma Nova Iorque contemporânea, mas não chega a desenvolver um pensamento sólido e aprofundado sobre o assunto.


High and Low - Toho Co. Ltd./Divulgação
High and Low - Toho Co. Ltd./Divulgação

No entanto, em meio a esse cenário, Spike Lee adapta a história de forma a trazer um retrato pessoal e com potencial interessante para dentro da trama: as relações de poder dentro do meio da música negra em um ecossistema tão historicamente prolífico como Nova Iorque. Desde o nascimento da cultura hip hop na cidade em meados dos anos 1970, os chamados gatekeepers surgem como figuras influentes, responsáveis por ditar aquilo que receberá ou não destaque – empresários, críticos, donos de gravadoras, de casa de shows, de emissoras de rádio ou de distribuidoras de música. A relação entre os artistas e essas figuras sempre foi de simbiose: ambos precisavam um do outro para preservar a cultura e prosperar. Contudo, com a chegada da realidade contemporânea, outras forças passaram a influenciar essa dinâmica.


O avanço da internet, da realidade digital e das estruturas ultra capitalistas fez com que tanto artistas quanto gatekeepers perdessem poder de ditar o que poderia florescer dentro da indústria, criando novas carências e demandas para ambos. Aqui, Spike Lee atua como alguém que vivenciou o período de surgimento e crescimento desse meio de perto, mas que agora também enxerga a forma como toda essa dinâmica tem drasticamente mudado.


Ao retratar o embate entre um profissional da curadoria musical da velha guarda e um jovem artista independente em busca de oportunidade, Archie (interpretado pelo músico contemporâneo A$AP Rocky, o que agrega à temática), o diretor confronta passado e presente, ambos em crise. Apesar da proposta interessante, esse debate ocupa grande parte do filme apenas como elemento decorativo, com poucas cenas que de fato elaboram as implicações e dicotomias desse universo. Nos momentos finais, essa iniciativa dá as caras e se posiciona descaradamente diante da audiência, com diálogos diretos entre os dois personagens. Contudo, a essa altura, a conversa assume um tom muito mais didático e engessado do que democrático.


A$ap Rocky, Spike Lee e Denzel Washington - Andreas Rentz/Reprodução
A$ap Rocky, Spike Lee e Denzel Washington - Andreas Rentz/Reprodução

A questão é que, em Highest 2 Lowest, o diretor está mais interessado em ambientar esteticamente a indústria musical na cidade do que de fato traçar questões socioculturais – e é aí que toda essa faceta do filme se perde. A primeira metade da obra busca nos mostrar a vida de King, seus laços familiares, seus dilemas, seus sonhos, mas nada disso possui substância crível – assim, as decisões do personagem, as viradas e os reflexos disso na vida dos personagens não surgem de forma orgânica e não causam impacto no espectador.


Se, em algum momento, o protagonista se encontra totalmente fora da realidade, ao cogitar deixar o jovem sequestrado morrer, minutos depois todo o peso desse discurso é abandonado com a simples justificativa de “eu estava de cabeça cheia”. Unido à uma trilha sonora espalhafatosa e um tanto quanto novelesca, o diretor parece tentar criar uma história épica que só tem forma entendível dentro de sua própria mente criativa, mas que não se manifesta adequadamente fora dela.


Apesar de atuações que não incomodam tanto na performance, personagens como a esposa, o filho e o melhor amigo de David King (interpretados por Ilfenesh Hadera, Aubrey Joseph e Jeffrey Wright respectivamente) são tratados como protagonistas apesar de serem extremamente superficiais e não produzirem nenhum impacto de importância para a trama. Entretanto, a situação é pior quando o próprio protagonista não se destaca. Falar que o filme carece de substância está diretamente ligado em como o personagem parece tomar diferentes decisões por ímpeto vazio.


Em momento algum ele é realmente posto em contradição diante de suas ações e da realidade que ele vive para que haja uma mudança no pensamento – até porque as personagens que vão, em teoria, contrapor o ponto de vista de King são os mesmos que mais cedo são mal caracterizados e utilizados de forma negligente ao apenas cumprirem um papel de instrumento para o passo a passo narrativo. Apesar do final clichê criado para simbolizar um processo de mudança interna no personagem ao fim de seu arco, essencialmente é perceptível como suas atitudes e visão de mundo não mudaram substancialmente.


Nota: 2/5

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