Design, arquitetura e tradição na CASACOR Minas Gerais 2025
- Revista Curió
- 26 de ago.
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Com o tema “Semear Sonhos”, evento chega à 30ª edição propondo reflexões sobre sustentabilidade e o futuro do morar
Por: Isis F. Zappellini
Última atualização: 26/08/2025

Entre os dias 15 de agosto e 5 de outubro, Belo Horizonte recebe a 30ª edição da CASACOR Minas Gerais. Com muita brasilidade, o evento acontece no prédio histórico construído originalmente para abrigar o Instituto Metodista Izabela Hendrix, na rua da Bahia. Inaugurada em 1941, a edificação em estilo Art Déco hoje integra o Circuito Liberdade, e funciona como unidade da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Lourdes).
A convite da organização, a Revista Curió visitou a exposição, que neste ano tem como tema “Semear Sonhos”. Diretor executivo na CASACOR Minas, Eduardo Faleiro afirma que a escolha “reflete muito o momento que vivemos, principalmente questões ligadas à sustentabilidade, ao futuro que queremos deixar para os nossos filhos, o futuro do morar, o que nós desejamos a curto, médio e longo prazo. Esse é o desafio proposto para os arquitetos, de repensarem os ambientes e apresentarem soluções que representem como podemos semear ações a partir do olhar de cada um deles”.
As escolhas começam já pela definição do local, onde funcionava a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Instituto – considerada uma das melhores do Brasil. O prédio foi idealizado pelo arquiteto italiano Raffaello Berti, responsável também por outros importantes edifícios na capital mineira. Neste projeto, ele adotou a estética francesa, representada na fachada geométrica com ornamentos lineares e simétricos, retas verticais e colunas na entrada, elementos que mostram a imponência do Art Déco. Por dentro, há corredores extensos, cômodos amplos e um pé direito alto, que foram aproveitados pela curadoria para transformar espaços de passagem em espaços de permanência.
Nos 49 ambientes assinados por 74 profissionais das áreas de arquitetura, design e paisagismo, é possível caminhar entre estruturas muito diversas, como quartos, salas, cozinhas e banheiros – cômodos comuns de qualquer casa –, além de conhecer algumas propostas comerciais, áreas externas e restaurantes. Em toda parte, os elementos naturais são muito valorizados, tanto por meio de materiais como tecidos de fibra (como juta e algodão), mármore e granito; quanto com o uso constante de plantas, evidenciando a demanda cada vez maior por integração entre a vida humana e a natureza. Quanto à forma, a forte presença de curvas nos acabamentos é o que chama a atenção nos móveis planejados e nas escolhas de mobiliário.
Modernismo brasileiro e tradições mineiras
Um dos destaques da CASACOR Minas 2025 é a Sala Brasileira, criação da arquiteta Ana Bahia em comemoração aos 80 anos da Líder Interiores. A partir de elementos que transitam com fluência entre o acolhedor e o inusitado, o espaço combina presente e passado, materiais e tonalidades que traduzem, ao mesmo tempo, um olhar único, ousado e íntimo.
O ambiente, que integra sala de estar e de jantar, faz referência ao modernismo brasileiro, por meio da escolha dos móveis, como a poltrona desenhada por Geraldo de Barros, artista que atuou entre os anos 1940 e 1950. Na Cadeira Dique (Líder), na Mesa de Jantar Viga (Suíte Design) e na Cadeira Manguezal (Maurício Arruda) percebe-se um conceito mais limpo, uma geometria forte, uso de curvas (Dique) ou retas (Viga e Manguezal), unindo simplicidade e funcionalidade para criar peças confortáveis, com materiais de qualidade, como a madeira maciça.

Embora essas sejam características marcantes na estética modernista da movelaria brasileira, é importante destacar que os designs únicos e a autenticidade de cada criador também estão presentes. De forma geral, a madeira se destaca no ambiente, desde o belíssimo chão de taco até os detalhes das molduras das obras de arte, mesclados a escolhas contemporâneas, como as peças dos mineiros Juliana Vasconcellos, Marllon Morais e Rodrigo Queiroz (Estúdio Dentro).
Presente em metade das 30 edições da CASACOR Minas, Ana Bahia explica que nas mostras de decoração sempre há um pouco dela, do que acredita e gosta, ou seja, uma arquitetura mais viva e intensa. “Cada projeto é uma história nova e aqui eu queria contar a história de uma casa brasileira, com potência, com cor, que o Brasil tem e que a Líder tem também. São 80 anos de história, ela participou de várias fases do mobiliário brasileiro, e está sempre se desenvolvendo, criando… Mas ao mesmo tempo tem essa característica vintage, nenhuma casa tem mobiliário de um lugar só. Se ela conta uma história, tem elementos de diversas fases da família, das viagens, de tudo”, avalia a arquiteta.
Outro ambiente que atrai os olhares é a Suíte Hotel Ouro do Cerrado. Projetado por Sérgio Viana, o espaço é permeado por vários objetos e materiais que remetem a Minas Gerais. A acomodação luxuosa e confortável conta com uma cama de casal, escrivaninha e um armário planejado com bar embutido, cheio de comidas e bebidas típicas do estado. O banheiro espaçoso separa box para banho, lavabo e bacia sanitária, em um revestimento de mármore exuberante – o “Ouro do Cerrado”, que nomeia o cômodo – além da banheira em pedra sabão polida.

Com tons neutros e terrosos, o arquiteto traz elegância e tradição para o ambiente. Os móveis contemporâneos mostram conforto e sofisticação, assim como objetos e acabamentos em madeira atrelados a luz indireta amarelada, que deixam o ambiente aconchegante. O resultado é um espaço de introspecção que convida à permanência, oferecendo suporte para várias situações sem sair do quarto.
Refletindo sonhos
Enquanto a Sala Brasileira e a Suíte Hotel Ouro do Cerrado cumprem papel quase cenográfico – um tipo de “coisa de novela” –, outros espaços são projetados como ambientes completamente funcionais que comportam o uso do público, como banheiros e restaurantes. Por outro lado, também há ambientes mais conceituais, bem exemplificados pela Sala dos Espelhos, das novatas Mariana Queiroz e Patrícia Naves (Esc. Arquitetura).
A proposta do cômodo é de enaltecer a mesa de jantar e o costume de se reunir ao redor da comida para compartilhar o momento. Cozinhar e partilhar o alimento são atos de afeto, que fortalecem as relações sociais, e o foco é transmitir esse recorte cultural por meio da replicação da imagem da mesa de jantar nos grandes objetos espelhados que preenchem o espaço.
Patrícia Naves explica que o processo criativo partiu da ideia de destacar a mesa de centro da sala de jantar, reverenciando esta importante peça dos lares brasileiros. Ela menciona que o conceito consiste em “circular o ambiente com os espelhos e tirar todos os elementos excessivos. Dessa forma o espelho replica a imagem e faz referência há alguns elementos constantes nesse tipo de espaço, como bancos e um buffet. Nós criamos essas proporções para não serem opressoras, para serem familiares sem as pessoas saberem. Então a ideia era essa, de um ambiente limpo, mas ao mesmo tempo aconchegante”.

As cores em tons terrosos e amarelados referem-se a paisagens mineiras, retratadas no vermelho do ferro, o amarelo do cerrado e o terracota das cerâmicas. Cada um dos poucos objetos decorativos foi escolhido a dedo: o estandarte evidencia a produção artesanal local, há peças de Lorenzato, Zé Bento e Véio, além de cactos e espadas de São Jorge. Em equilíbrio com a extensa mesa de madeira, está o pendente orgânico e fluido de Adriana Yazbek.
De diferentes formas é possível perceber a materialização dos sonhos de Minas para o futuro, mantendo a tradição de receber pessoas com muita hospitalidade, conforto, aconchego e boa comida. Também é importante destacar que as obras prezam pela valorização da arte popular e por incorporar cada vez mais a natureza aos espaços, por meio do design biofílico – abordagem de arquitetura e design de interiores que conecta as pessoas com a natureza nos espaços construídos, promovendo bem-estar e saúde.
30 anos de CASACOR Minas
Em 2025, a CASACOR Minas celebra 30 anos como a maior e mais completa mostra de arquitetura, arte, design de interiores e paisagismo das Américas em Belo Horizonte. Ao longo dos anos, a exposição consolidou-se como a mais relevante plataforma do segmento no estado, promovendo o trabalho de arquitetos, designers e paisagistas e conectando profissionais e o mercado.
O projeto é responsável por lançar e reforçar tendências, valorizando as produções dos lugares onde está presente – que se expandem cada vez mais. Em Minas Gerais, a CASACOR tradicionalmente ocupa importantes prédios históricos e símbolos arquitetônicos que carregam décadas da história de BH, o que acontece desde a primeira edição, em 1995, quando foi realizada no prédio onde hoje funciona o Arquivo Público Mineiro, na avenida João Pinheiro.
Há alguns anos, a sustentabilidade está entre os objetivos da mostra, que pensa não só no paisagismo como qualidade de vida e conexão com a natureza, mas também está atenta ao uso de materiais sustentáveis e de energia limpa e renovável. Em 2021, o Espaço (COM)VIVER, apresentou um projeto residencial construído a partir de resíduos de obras e com a participação das mulheres dos projetos Arquitetura na Periferia e Bioarquitetar, que integram nos revestimentos o uso de pigmentos extraídos da terra.
No ano anterior, o destaque ficou por conta do retrofit do Espaço 365, um processo de modernização consciente, que atualiza a estrutura pensando em manter o patrimônio. O processo ocorreu por meio da implementação de instalações e revestimentos que utilizam menos energia, são mais seguras e adotam tecnologias mais duradouras. Já na edição deste ano, a ArcelorMittal, uma das patrocinadoras do evento, apresentou novidades no desenvolvimento de vergalhões produzidos com 100% de sucata metálica, 100% de energia renovável e baixa emissão de carbono. Já a ClickLivre é a responsável pelo fornecimento energético da mostra, abastecida por energia captada em painéis solares.
No geral, a experiência da CASACOR é inspiradora, já que possibilita aos visitantes conhecer ou se atualizarem de técnicas, materiais e estéticas em forma de exposição. É fato que o contexto sociocultural se mostra de diversas formas, e com certeza se manifesta na forma do morar. O uso de curvas, leveza e organicidade está cada vez mais presente, não só em ambientes físicos, mas também em plataformas digitais, por exemplo.
A visão do futuro muda conforme a sociedade avança, e pouco a pouco a sociedade se aproxima mais de um “futuro verde”, enxergando a simbiose da natureza com as cidades, que hoje se manifesta especialmente em projetos de bioconstrução, telhados verdes, hortas comunitárias e jardins verticais. E assim os sonhos de um futuro de equilíbrio seguem sendo semeados.
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