O ritmo e movimento que conectam a música eletrônica periférica ao público em BH
- Revista Curió
- 11 de jun.
- 6 min de leitura
Atualizado: 17 de jun.
Sejam bem vindos à Baile Room
Por: Alicia Coura e Ana Carolina Costa
Última Atualização: 11/06/2025

Foi em 2018 que quatro DJs iniciaram o projeto que iria modificar o cenário da música eletrônica periférica da cidade de Belo Horizonte. “Conectamos você a novas sonoridades”, com essa premissa, surge a Baile Room, considerada uma das principais referências da cena eletrônica de BH. Formada por DJ Kingdom, D.A.N.V, Kramer e Vhoor, o encontro entre eles foi um tanto quanto inesperado, mas o que não sabiam era que sete anos depois a história estaria sendo contada e documentada no cenário cultural belorizontino.
Para entender melhor a Baile Room, é necessário compreender de que forma esse coletivo se encaixa dentro das pistas da capital mineira. Belo Horizonte é conhecida por ser um dos principais pólos de música eletrônica do país, com um crescimento expansivo do mercado nos últimos anos, a cidade é palco de diversas manifestações artísticas envolvendo a discotecagem em seus diversos estilos e gêneros. Do techno ao soundsystem, BH vem expandindo a cena eletrônica noturna, o que permitiu o surgimento de vários coletivos de DJs que são responsáveis pela movimentação da cultura underground da cidade.
Apesar de apresentar um catálogo grande de novos artistas e coletivos, BH ainda é marcada pela falta de incentivo público à cultura, fechamento de espaços de lazer e falta de investimento privado em relação à cultura underground da cidade. Esse contexto era ainda mais forte em 2018, quando aconteceu a primeira edição da Baile Room.

Na época, os eventos de discotecagem da cidade eram realizados em regiões mais elitizadas e pouco acessadas pela população preta e periférica. A partir daí, os artistas do coletivo, que já atuavam em projetos separados, resolveram se juntar para explorar novas sonoridades, celebrar a cultura dos ritmos periféricos e redefinir a identidade sonora nos eventos noturnos da cidade.
Decididos a gerar uma movimentação no cenário cultural e modificar a forma de curtir a cidade, os integrantes do grupo que já tinham uma vivência ativa no SoundCloud, perceberam que os espaços culturais noturnos eram pouco receptivos com o funk e suas variações, e essa foi a virada de chave para tudo o que viria a seguir.
O nome Baile Room, sugerido pelo Vhoor em uma mesa de bar, surgiu a partir de uma inspiração direta da Boiler Room, evento internacional criado na Inglaterra em 2010. A ideia principal era seguir os moldes da festa original com aproximação do público e do DJ, mas referenciando as raízes do funk e da cultura hip hop.
Depois da primeira edição, o evento ficou cada vez mais popular e sete anos depois, o coletivo realizou uma apresentação marcante na própria Boiler Room, que teve sua segunda edição em BH no dia 12 de abril deste ano.
Baile Room x Boiler Room

O projeto londrino Boiler Room, conhecido por realizar diversos eventos de discotecagem ao longo do mundo com transmissão ao vivo, teve sua segunda edição em Belo Horizonte após 5 anos e teve a Baile Room como uma de suas atrações principais. Além disso, o evento contou com uma curadoria de artistas locais e junto com eles, um público de mais de 1000 pessoas. A Baile Room também realizou um marco histórico: foi o primeiro coletivo de DJs brasileiros a se apresentarem juntos em um set da Boiler.
“Essa edição já está escrita nos livros de história” brincou DJ Kingdom.
Ela conta que os ingressos para o evento esgotaram em menos de 5 minutos, o que foi um choque muito grande para todos os membros do coletivo, mas também a realização de um sonho.
“Nossa, colaborar com a Boiler foi um sonho. Pensar que lá atrás a gente começou se inspirando nos caras e de alguma forma eles chegaram no nosso trampo foi muito louco. E de lá para cá, com a visibilidade que tudo tomou, é algo que vem alavancando a nossa carreira e abriu muitas oportunidades para cada membro." Relatou a DJ.
A participação da Baile Room no evento foi fundamental para mudar toda a rota do coletivo até então. Os integrantes contam que após a apresentação, a visibilidade do grupo aumentou significativamente, o que possibilitou uma projeção maior para projetos futuros.
Apesar de terem colocado em evidência o cenário belorizontino como participante ativo da cena eletrônica internacional, o coletivo ressaltou que o contexto atual em relação à cultura eletrônica em Belo Horizonte ainda é muito precário comparado a outras capitais do Brasil.
“A gente esteve em São Paulo recentemente, percebemos que a procura e a valorização da arte em SP e no Rio é muito diferente, o que não faz muito sentido porque Belo Horizonte está no mesmo eixo, né? É muito diferente como o mercado a música tem muito mais atenção nos outros lugares. A estrutura, o acesso, o som… São detalhes que acabam contando muito.” Disse DJ Kingdom.
A artista comentou que realizar eventos em Belo Horizonte está cada vez mais difícil, devido às políticas de liberação de espaços públicos e privados, fechamento de casas de shows, questões burocráticas e valores acima do mercado. Ainda ressaltou que essas questões estão diretamente ligadas à falta de patrocínio de grandes marcas dentro dos espaços de lazer da cidade, o que pode resultar no aumento do valor dos ingressos e consequentemente na dificuldade de acesso do público.
Partindo de uma visão mais democrática, o coletivo afirma que objetivo dos eventos da Baile Room, além de promover uma identidade plural e diversa na cena da cidade, é também democratizar o acesso e permitir com que as festas sejam realizadas em locais seguros e confortáveis para todos os tipos de públicos.
“A Baile, Volume I” e rebranding

Além da participação na Boiler Room com lançamento do set no dia 10 de junho, o coletivo se preparou para a estreia do primeiro EP intitulado “A Baile, Volume I”, lançado no dia 30 de maio. O álbum conta com 12 faixas e é marcado por elementos do funk de BH, house, além de abordagens individuais de cada DJ.
Segundo os integrantes, o lançamento do EP está relacionado a uma nova fase de experimentação do grupo. O coletivo está passando por um rebranding de marca com a construção de um novo selo chamado “A Baile”, que além de promover os lançamentos futuros do grupo, vai abrir espaços para novos artistas da cidade. Apesar da mudança de nome, a Baile Room vai continuar acontecendo como parte do novo selo criado.
“A Baile é a essa plataforma que estamos montando para poder fazer exatamente isso: soltar nosso trabalho autoral e trazer para frente essas outras pessoas que merecem reconhecimento, mas as festas continuarão acontecendo normalmente como “baile room.” cContou Kramer.
Como a Baile Room revolucionou a cena underground de BH?

Ao longo dos anos, a Baile Room foi se consolidando e popularizando no cenário cultural da cidade e principalmente nas redes sociais. A festa que antes tinha sido produzida para um público pequeno que não se via representado nas pistas belorizontinas, hoje alcança grandes festivais e artistas de peso. Mas será que isso mudou a essência do rolê?
Esse questionamento pode ser respondido de diversas formas, mas o que pode ser percebido é - de que forma o coletivo abre espaço para novos artistas da cena underground. Com mais autonomia e investimento, o grupo vem colocando em evidência novos coletivos da cena, e criando novas conexões dentro do movimento da discotecagem. A partir desse objetivo, o evento Baile Room Soundsystem - criado no ano passado - reúne uma curadoria de artistas de gêneros diversos da discotecagem em uma festa com entrada gratuita em uma das principais regiões da cidade.
Dentro do cenário de música eletrônica periférica em BH, essa é uma iniciativa essencial, levando em consideração o contexto atual da cidade, e os questionamentos políticos que estão em pauta, relacionados à criminalização do funk na capital mineira.
A Baile Room segue com a proposta de ser um projeto plural, que abraça os ritmos periféricos e promove uma cultura diversa na cidade, assim como outros coletivos que estão na corrida constante de conseguir espaço em BH, mesmo que muitas vezes sem o investimento necessário.
Enfim, surge um questionamento: Qual é o futuro da música eletrônica periférica de BH que você quer vivenciar nos próximos anos?
Mudaram a cena de BH! Bom demais ver pessoas tão talentosas lutando por nós toda semana. Vida longa!