O Tarifa Zero e o acesso à Cultura
- Revista Curió
- 4 de nov.
- 3 min de leitura
Por: Isis F. Zappellini e Luiza Guimarães
Última Atualização: 04/11

A mobilidade urbana é um direito de todo cidadão. As condições de vias e dos sistemas de transporte são fatores essenciais para a qualidade de vida da população que deveria ser beneficiada pelas políticas públicas das cidades. Belo Horizonte foi planejada no século passado e hoje é um dos principais centros urbanos, culturais, econômicos e comerciais do país. A infraestrutura está parada no tempo, assim como a mente de alguns vereadores da capital mineira.
O movimento Tarifa Zero é uma política de gratuidade no transporte coletivo belo-horizontino, inspirada em projetos bem-sucedidos implementados ao redor do mundo. Nele, os princípios distributivos de capital garantem uma reorganização no sistema que não pesa no bolso de ninguém e contribui para a manutenção da BHTrans e de outros serviços da cidade, como coleta de lixo e iluminação pública. “O PL da tarifa zero não é apenas uma proposta de mobilidade, é uma política de redistribuição de renda, de justiça climática e de garantias dos direitos na cidade”, afirma a vereadora Jhulia Santos.
A vereadora do PSOL Iza Lourença, que encabeça o PL 60/2025 que extingue o pagamento de passagem de ônibus de Belo Horizonte, deu uma entrevista para o Podcast Pod Ônibus que foi ao ar no dia 17 de março de 2025. Em suas falas, defende que o transporte de qualidade deveria ser um direito e não um favor do governo para os cidadãos. Ela explica que a grande mudança seria para as empresas da cidade que, ao invés de pagar um vale transporte para cada funcionário, pagariam uma taxa de valor fixo para prefeitura, proporcional ao número de empregados. Empresas com menos de 9 funcionários não pagariam e, de acordo com a entrevistada, isso seria um incentivo para a economia local.
A grande esperança desse projeto é que a classe trabalhadora, com esse alívio no bolso, possa usufruir mais do que a cidade tem a oferecer, participar de mais “rolês” que Belo Horizonte é internacionalmente reconhecida, como circuitos culturais, musicais e gastronômicos.
A região central da capital mineira protagoniza a maior parte dos grandes eventos, apresentações, feiras e exposições. Um bom exemplo é o Circuito Liberdade, que concentra os 15 prédios na área Centro-Sul da cidade e recebe renomadas programações, além do Cine Brasil Vallourec, SesiMinas e Sesc Palladium. Por mais que os eventos sejam gratuitos, com entrada social ou se enquadrem na lei da meia entrada, não são tão acessíveis quando se tem que levar em consideração o valor “da ida e da volta” do transporte. A Tarifa Zero permitiria mais momentos de lazer para a população que está longe do centro urbano e com a reestruturação dos horários e frotas dos ônibus da cidade, traria a oportunidade de aproveitar o que BH tem de melhor para oferecer.
Não é novidade que há muito o que melhorar no acesso à cultura na grande Belo Horizonte, de incentivo do consumo cultural ao investimento governamental pelo deslocamento da população. O que nos resta é defender a pauta do transporte público de qualidade para todos, participando de manifestações e mobilizações em relação à recente votação no plenário. Ocorrida no dia 3 de outubro de 2025, a reunião decisiva para esse ato revolucionário de mobilidade urbana, infelizmente, encerrou sem bons resultados. A proposição precisaria de pelo menos 28 votos favoráveis, porém apesar das manifestações em massa e participação popular, recebeu o “sim” de apenas 10 vereadores e agora será arquivada.
Mesmo com estudos sólidos, realizados pela UFMG, mostrando a viabilidade da implantação da Tarifa Zero, se executada de forma socioeconomicamente sustentável, o principal argumento dos vereadores, ainda se coloca na preocupação do financiamento do projeto, afinal quem tem envolvimento com as grandes empresas não quer abdicar de 1% do seu lucro para beneficiar a classe trabalhadora. Esse valor não faria diferença para os donos desses empreendimentos e seus beneficiados, e aqueles que discordam, convido a usar exclusivamente do transporte coletivo por uma semana, e calcular qual seria 1% da sua renda para compreenderem a proporção da diferença que isso faria na vida dos belo-horizontinos.
Mas não devemos desistir! Belo Horizonte ainda pode ser a primeira capital com passe livre nos ônibus, juntando-se a uma lista de quase 140 outras cidades brasileiras que mostram resultados expressivamente positivos: as pessoas circulam mais nas ruas, conseguem acessar mais direitos básicos como saúde, lazer e educação, além do fomento do comércio local. Os próximos passos devem se concentrar na reestruturação do projeto por parte dos vereadores, para voltar à câmara no ano que vem. Enquanto cidadãos, devemos continuar mantendo o assunto em pauta, permanecer manifestando o desejo da comunidade e acompanhar o trabalho dos políticos que votaram a favor, garantindo a continuidade da atuação em relação ao projeto.



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